31 janeiro 2009

Ilusões




Seriados são o meu vício. Aqueles americanos, enlatados mesmo, que a gente vê aos montes pelas TVs a cabo da vida – e que agora começam a invadir a TV aberta também. Pois sim, seriados. Passo boa parte do meu tempo assistindo-os, e isso de fato é das coisas mais relaxantes que faço (fora as óbvias, é claro).
Eis que num dado momento me deparo com um personagem de uma série que parece muito um conhecido. O que é curioso, já que os protagonistas desse tipo de programa normalmente transitam entre um extremo e outro dos estereótipos, ou o são por completo. Mas o fato é que o tal conhecido parece demais o tal personagem, o jeito de agir e de pensar principalmente. E eu me pergunto se isso é coisa da minha cabeça, se é uma percepção real ou uma ilusão criada pelo vício, como quando alucinações surgem ao usar LSD ou ao tomar um chá de cogumelos.
Sim, ilusões. Sinto que grande parte da minha vivência caracteriza-se pela criação delas. Ilusão de que o tempo não vai passar nunca, ilusão de que o coração vai algum dia encontrar um par, ilusão de que tudo vai muito bem – obrigada – mas ao chegar mais perto, há sempre um incômodo, uma pulguinha, um nadinha que insiste em perturbar. Não que seja sempre tudo uma ilusão. Há momentos em que as percepções são completamente cabíveis em si mesmas, sem drama, mas há outros – a maioria eu ousaria dizer – em que as ilusões guiam para tudo aquilo que é confortável, conhecido, fácil.
Sentimos sempre muito medo, ele é aquela emoção primordial, básica, instintiva, que nos mantém vivos ou pelo menos “sobrevivos”. Ele e a dor. Sim, porque no nosso corpo, em cada célula, temos mais receptores de dor do que qualquer outra coisa. E a dor transita entre o medo e o prazer, o tempo todo. Há uma infinidade de práticas que associam a dor ao prazer – e freqüentemente ao sexo – e acho que a busca pelo sofrimento, pela manutenção do sofrimento cotidiano, é a mais difícil de ser percebida e a mais comumente “utilizada”.
Não há muito me descobri altamente masoquista nesse sentido último. As dores da vida, dos amores, das amizades, eram sempre perduradas, como se fosse a coisa mais bacana do mundo ser sofredor: quiçá, nos vendem o grande homem de Deus como o maior sofredor de todos os tempos. Mas essa busca não é vã. Ela tem uma simples função, simples mas de vital importância e de puro instinto: nos fazer sentir vivos.
Nós somos seres complexos, paradoxais, contraditórios por natureza. Vivemos na cegueira de nós mesmos, nas crenças e nas ilusões que criamos e acreditamos piamente. Mas buscando sempre a sobrevida, o que é extremamente triste. Mal sabemos que existe uma vida, que vai muito além da sobrevivência. Existem escolhas, consciência, amor (real), e mesmo que vivamos inevitavelmente sob a nossa própria ótica e percepção, há um momento em que tudo faz sentido, em que há calma e tranqüilidade e uma profunda paz de espírito, e uma vozinha diz “é isso, está tudo em seu lugar, estou no caminho certo”.
Amém.


A.

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